Da Amazônia ao Sul: Os Pratos Regionais que Contam a História do Brasil

A gastronomia brasileira é um verdadeiro reflexo da diversidade cultural, histórica e geográfica do país. Cada prato, ingrediente e técnica culinária tem uma história própria, muitas vezes ligadas às tradições indígenas, à chegada dos colonizadores e à influência dos povos africanos, europeus e asiáticos. Ao saborear uma receita típica, estamos, na verdade, experimentando séculos de influências e intercâmbios que moldaram a nação.

Explorar os pratos típicos de cada região é mais do que uma experiência gastronômica: é uma forma de viajar pela história do Brasil. Cada sabor conta uma história única, que remonta às origens de diferentes povos e ao desenvolvimento de uma cultura própria, forjada por meio da convivência entre tradições, clima e recursos naturais. Desde a imersão nas florestas da Amazônia até os campos do Sul, a culinária brasileira revela as peculiaridades e as riquezas de cada local.

O objetivo deste artigo é destacar como a culinária brasileira, ao longo de suas diversas regiões, reflete as influências históricas, étnicas e geográficas que moldaram o Brasil. Ao percorrermos esse vasto território, veremos como os pratos regionais, com suas cores, aromas e sabores, são a verdadeira representação de um país plural, cuja essência está expressa não apenas na história, mas também nas panelas.

A Gastronomia do Norte: A Amazônia e seus Sabores

A cozinha amazônica é um reflexo direto da rica biodiversidade da região e da mistura de influências culturais que formaram o Brasil. A gastronomia do Norte, em especial, é marcada pela fusão de saberes indígenas, africanos e portugueses, criando pratos únicos que utilizam ingredientes locais e tradicionais. Cada receita é um testemunho da convivência entre os povos e da adaptação às condições naturais e climáticas da floresta amazônica. A culinária da região é, portanto, uma expressão de resistência e criatividade, com pratos que fazem uso de ingredientes autênticos e, muitas vezes, exclusivos da região.

Prato em destaque: Tacacá – História e Ingredientes

O tacacá é um dos pratos mais emblemáticos da Amazônia e carrega consigo um imenso simbolismo cultural. Originário das tradições indígenas, esse prato é composto por tucupi (um caldo extraído da mandioca), goma de tapioca, camarões secos e jambu (uma planta típica da região). Seu preparo e consumo têm uma conexão direta com a história indígena, que já utilizava o tucupi em suas refeições há séculos. O tacacá é especialmente popular nas ruas de Belém e no Pará, sendo servido quente em cuias de barro, e é considerado um prato revigorante.

Além de sua saborosa combinação de ingredientes, o tacacá também é um exemplo da adaptação do povo amazônico à natureza. O tucupi, por exemplo, passa por um longo processo de cozimento para eliminar a toxicidade da mandioca, mostrando o profundo conhecimento que os povos indígenas têm dos recursos naturais ao seu redor.

Prato em destaque: Bacalhau de Cocora – Preparação e Significado Cultural

Outro prato típico da região é o bacalhau de cocora, uma iguaria que mistura a tradição portuguesa com os ingredientes da Amazônia. O nome “cocora” se refere a um tipo de palmeira nativa da região, cujos frutos são usados para preparar o prato. A receita consiste em desfiar o bacalhau e misturá-lo com o leite de coco, acompanhados de legumes típicos da região, como o milho verde e o arroz. Esse prato, embora remeta à herança portuguesa, ganha uma identidade local ao incorporar o leite de coco e outros ingredientes da floresta amazônica, criando uma combinação de sabores que une o velho e o novo mundo.

Além de ser um prato saboroso, o bacalhau de cocora simboliza a mistura cultural da Amazônia, onde as influências de diversos povos foram se fundindo ao longo dos séculos para formar uma culinária única. Ele também reflete a adaptação dos colonizadores portugueses às novas matérias-primas que encontraram ao chegar ao Brasil.

A Relação com a Natureza

Os pratos amazônicos são, em sua essência, um reflexo da relação intrínseca entre o povo da região e a natureza. Ingredientes como o tucupi, o jambu, o açaí, o pequi e o bacaba são extraídos diretamente das florestas e rios da Amazônia, e a preparação dos alimentos respeita e celebra esses recursos naturais. A culinária amazônica não é apenas uma questão de nutrição, mas uma maneira de preservar e valorizar o meio ambiente. Ao utilizar produtos locais, as receitas buscam manter viva a conexão com o território, promovendo, ao mesmo tempo, um profundo respeito pela sustentabilidade e pelos saberes tradicionais.

Dessa forma, a gastronomia do Norte do Brasil não é apenas uma forma de sustento, mas também um elo com as raízes culturais da região, tornando-se uma verdadeira história contada através de sabores e ingredientes que falam sobre o passado e o presente da Amazônia.

Nordeste: Sabores que Contam a História da Colonização e Escravidão

A gastronomia nordestina é um dos maiores exemplos de como a culinária brasileira reflete a história do país. As influências africanas, indígenas e portuguesas se misturam de maneira única, criando pratos cheios de sabor, histórias e simbolismos. Durante o período de colonização, o Nordeste foi um dos primeiros locais a receber grandes influências culturais e gastronômicas, especialmente com a chegada de escravizados africanos, cujas tradições alimentares se fundiram com os hábitos locais e com os ingredientes nativos. A culinária nordestina, portanto, conta uma história de adaptação, resistência e celebração, marcada por uma profunda conexão com a terra e com as tradições.

A Influência Africana e Indígena na Culinária Nordestina

As raízes africanas desempenham um papel central na formação da culinária do Nordeste. Ingredientes como o azeite de dendê, a farinha de mandioca, o feijão e o coco são essenciais nos pratos típicos da região e refletem os saberes africanos que foram trazidos pelos escravizados. Além disso, os indígenas também deixaram sua marca na culinária nordestina, com o uso de raízes, tubérculos e frutos nativos como o caju, o maracujá e a batata-doce. O encontro dessas influências culturais ao longo do tempo resultou em uma cozinha de sabores intensos e marcantes, que hoje representa a identidade nordestina.

Prato em Destaque: Feijão Verde com Carne de Sol – A Conexão com a Agricultura e a Relação com os Costumes do Sertão

O feijão verde com carne de sol é um prato emblemático do sertão nordestino, que revela a relação dos habitantes da região com a agricultura e os costumes locais. A carne de sol, que é carne salgada e curada ao sol, é uma técnica tradicional de preservação de alimentos, desenvolvida a partir da necessidade de conservar a carne em um ambiente com altas temperaturas e sem acesso fácil à refrigeração. O feijão verde, por sua vez, é um ingrediente abundante no sertão e é frequentemente combinado com a carne de sol, criando uma refeição saborosa, nutritiva e energética, ideal para enfrentar as longas jornadas de trabalho no campo.

Esse prato tem uma conexão direta com a vida rural nordestina, onde a relação com a terra e a adaptação às duras condições climáticas moldaram a maneira de se alimentar. O feijão verde com carne de sol é, portanto, uma homenagem ao esforço do povo sertanejo em encontrar soluções simples e práticas para sobreviver e prosperar, ao mesmo tempo em que mantém vivas as tradições culinárias da região.

Prato em Destaque: Acarajé – História da Influência Africana e Sua Importância nas Festas Religiosas

O acarajé é um dos pratos mais icônicos da culinária nordestina e carrega consigo toda a força da influência africana no Brasil. Originário da África Ocidental, o acarajé é um bolinho frito de feijão-fradinho, recheado com camarão, vatapá e caruru, e é tradicionalmente servido nas festas religiosas do Candomblé e na famosa Festa de Iemanjá. Sua história está profundamente ligada à resistência e à preservação das tradições afro-brasileiras, especialmente durante o período de escravidão, quando os africanos escravizados utilizavam a comida como forma de manter vivas suas crenças e culturas.

Além de seu significado religioso, o acarajé também representa um momento de celebração, especialmente durante as festas populares da Bahia, como o Carnaval e o Círio de Nossa Senhora da Conceição da Praia. Seu consumo vai além do simples ato de alimentar-se; é uma verdadeira afirmação cultural e uma maneira de honrar as raízes africanas que formam a base da sociedade nordestina.

Como os Pratos do Nordeste Mesclam Histórias de Resistência e Celebração

A culinária do Nordeste é um testemunho vivo das histórias de resistência, adaptação e celebração que marcaram a trajetória da região. Pratos como o feijão verde com carne de sol e o acarajé refletem como a comida foi, e continua sendo, uma forma de resistência cultural, um meio de preservar tradições e fortalecer laços comunitários. Ao mesmo tempo, são também uma maneira de celebrar a vida, as festas e as religiões que nasceram no solo nordestino, criando uma culinária de grande significado simbólico e saboroso impacto.

Assim, a gastronomia nordestina não apenas alimenta o corpo, mas também nutre a alma, mantendo viva a história de um povo que, ao longo dos séculos, usou a comida como forma de resistência e celebração. Ao saborear um prato típico do Nordeste, somos convidados a mergulhar em uma história de superação, herança e identidade cultural.

Centro-Oeste: A Influência do Sertão e da Pecuária

A gastronomia do Centro-Oeste do Brasil é profundamente marcada pela vida rural, pela pecuária e pela agricultura, refletindo os costumes e as tradições que surgiram das vastas planícies do Cerrado. A região, composta por estados como Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, é conhecida por seu forte vínculo com a pecuária, além de suas vastas áreas agrícolas, que fornecem uma grande variedade de produtos que moldam a culinária local. A cozinha do Centro-Oeste não apenas reflete a herança rural, mas também revela como as condições geográficas e ambientais influenciam os pratos típicos da região.

A Contribuição da Pecuária e da Agricultura para a Culinária do Centro-Oeste

A pecuária tem um papel central na cultura alimentar do Centro-Oeste, especialmente pela grande produção de carne bovina que a região abriga. A criação de gado é uma tradição que se estende por gerações, e os pratos típicos frequentemente envolvem carnes assadas, defumadas ou curadas, como a carne de sol e o arroz tropeiro. A agricultura, por sua vez, complementa essa tradição com a produção de grãos como o milho, o arroz e o feijão, além de outros alimentos típicos do cerrado, como o pequi, o baru e o guariroba. Esses ingredientes, adaptados ao clima e ao solo da região, conferem aos pratos do Centro-Oeste sabores fortes e marcantes que falam da história e da vida rural local.

Prato em Destaque: Arroz com Pequi – Relação com o Cerrado e com a Cultura Indígena

O arroz com pequi é um prato típico do Centro-Oeste que se tornou um ícone da culinária local. O pequi, uma fruta nativa do Cerrado, tem um sabor único e é utilizado em diversas receitas tradicionais. A relação com a cultura indígena é clara, já que o pequi sempre foi uma importante fonte de alimento para os povos indígenas da região. O sabor do pequi é marcante, com uma mistura de amargor e cremosidade que combina perfeitamente com o arroz, criando uma harmonia de sabores que reflete a relação íntima entre o povo do Centro-Oeste e a natureza ao seu redor.

Além de seu sabor inconfundível, o arroz com pequi carrega consigo a história de resistência e adaptação dos povos locais. O pequi é um alimento que sobreviveu ao longo dos séculos graças ao seu sabor único e à sua capacidade de se adaptar ao clima árido do Cerrado, e sua inclusão na culinária do Centro-Oeste é um exemplo de como a comida pode ser uma ponte entre a natureza e a cultura de um povo.

Prato em Destaque: Carne de Sol com Arroz Tropeiro – O Reflexo da Vida Rural no Prato

Outro prato que exemplifica a vida rural do Centro-Oeste é a carne de sol com arroz tropeiro, que tem suas raízes nas tradições sertanejas. A carne de sol, feita a partir de carne bovina salgada e curada ao sol, é um alimento que reflete a necessidade de preservação da carne em regiões sem acesso a métodos modernos de refrigeração. O arroz tropeiro, por sua vez, é um prato simples e saboroso que mistura arroz, feijão, carne de sol, ovo e farinha de mandioca, criando uma refeição completa e nutritiva, ideal para os trabalhadores rurais.

Esse prato é um exemplo claro da adaptação do povo do Centro-Oeste às exigências da vida rural e do clima seco e quente da região. Ele reflete a resistência e a inventividade do povo sertanejo, que, com poucos recursos, criou pratos que são a base de sua alimentação diária e, ao mesmo tempo, expressam a sua conexão com a terra e com as atividades do campo.

A Relação da Comida com a Identidade Rural e com os Elementos Típicos do Centro-Oeste

Os pratos típicos do Centro-Oeste não são apenas uma questão de sabor; eles são a expressão da identidade rural da região. A comida do Centro-Oeste está intrinsecamente ligada ao modo de vida dos seus habitantes, especialmente à agricultura e à pecuária. A carne de sol, o arroz tropeiro e o arroz com pequi são pratos que contam a história de um povo que vive do campo, respeita os ciclos da natureza e valoriza os produtos que o Cerrado tem a oferecer.

Esses pratos não apenas alimentam, mas também afirmam a identidade de uma região onde o clima árido e as vastas paisagens moldam as tradições e os hábitos alimentares. Eles são a expressão de uma cultura rural rica, de uma gastronomia que vai além da comida, sendo uma maneira de celebrar a conexão com a terra, a história e a cultura do Centro-Oeste.

Ao explorar os sabores do Centro-Oeste, é possível entender como a culinária reflete a vida no sertão e nas grandes propriedades rurais, onde a comida não é apenas um meio de sobrevivência, mas um reflexo da luta, da criatividade e da adaptação ao ambiente local.

Sudeste: A Fusão de Tradições e a Culinária Cosmopolita

A gastronomia do Sudeste do Brasil é um verdadeiro reflexo da mistura de culturas que marcaram a formação da região. Com a chegada de imigrantes europeus, especialmente italianos, portugueses e espanhois, a culinária paulista e mineira se transformou, incorporando novos ingredientes e técnicas de preparo que deram origem a uma cozinha diversificada e cosmopolita. A culinária do Sudeste é um ponto de encontro de diferentes influências, e sua história está diretamente ligada ao processo de urbanização, ao crescimento industrial e ao movimento migratório que moldaram essa parte do Brasil.

A Influência dos Imigrantes Europeus, Principalmente Italianos, Portugueses e Espanhóis, na Gastronomia Paulista e Mineira

A imigração europeia teve um papel fundamental na formação da culinária do Sudeste. Os italianos, que se estabeleceram principalmente em São Paulo, trouxeram com eles pratos baseados em massas, que foram adaptados com ingredientes brasileiros, criando a famosa pizza paulista, o macarrão com molho de tomate e as massas recheadas. Os portugueses, por sua vez, influenciaram a culinária mineira com pratos de peixe, bacalhau e o famoso pão de queijo, que se tornou um símbolo da gastronomia de Minas Gerais. Já os espanhois, especialmente os imigrantes catalães, influenciaram a culinária do interior de São Paulo, trazendo pratos como a paella e incorporando o uso de arroz e frutos do mar na cozinha local.

Essa fusão de sabores e técnicas culminou em uma gastronomia de forte identidade, onde se mesclam elementos tradicionais e inovadores, formando uma cozinha que conversa com as tradições brasileiras ao mesmo tempo em que se abre para o mundo.

Prato em Destaque: Feijoada – Origens e Sua Evolução ao Longo do Tempo

A feijoada é um prato ícone da culinária brasileira e, em particular, da culinária do Sudeste, que tem suas raízes na escravidão e na fusão de culturas africanas e portuguesas. Originalmente, a feijoada era uma comida dos escravizados, feita com as sobras de carne que eram fornecidas aos trabalhadores. Com o tempo, a receita foi sendo refinada, ganhando status como um prato sofisticado e essencial nas festas e celebrações da classe alta.

A base da feijoada é o feijão preto, cozido junto com uma variedade de carnes, como carne de porco, linguiça, costelinha e carne seca, e temperado com alho, cebola e louro. Acompanhada de arroz, couve refogada e laranja, a feijoada reflete a diversidade de influências culturais no Brasil, sendo uma verdadeira síntese de sabores que vai do simples ao sofisticado. Com o tempo, o prato foi se tornando mais inclusivo, passando a ser servido nas casas de todos os brasileiros e se consagrando como uma das maiores representações da culinária nacional.

Prato em Destaque: Tutu de Feijão – Uma Iguaria Mineira com Sabores de Resistência

O tutu de feijão é uma iguaria típica de Minas Gerais, que carrega consigo uma forte carga histórica. Feito a partir do feijão cozido e triturado, o prato é temperado com alho, cebola, bacon e, muitas vezes, carne de sol. Sua base simples e saborosa reflete a vida no interior de Minas, onde a comida era feita com ingredientes simples, mas repletos de sabor. O tutu de feijão é tradicionalmente servido com arroz e, frequentemente, com torresmo, criando uma combinação irresistível que agrada a todos os paladares.

Mais do que uma comida, o tutu de feijão é um símbolo de resistência. Durante os períodos de escassez, os mineiros usavam o feijão como base para diversas receitas, transformando um ingrediente simples em uma refeição robusta e nutritiva. O prato também simboliza a resistência cultural, já que mantém vivos os sabores e as tradições que marcaram o desenvolvimento da gastronomia mineira.

Como a Mistura de Culturas de Todo o Brasil é Refletida na Culinária do Sudeste

A culinária do Sudeste do Brasil é um exemplo claro de como diferentes culturas podem se fundir para criar algo novo e único. A influência dos imigrantes europeus foi crucial na criação de uma gastronomia que mescla o tradicional e o cosmopolita. Pratos como a feijoada e o tutu de feijão mostram como, mesmo em um cenário de fusão cultural, os sabores locais se mantêm, e a comida se torna um elo entre o passado e o presente.

No Sudeste, a cozinha não é apenas uma mistura de ingredientes e técnicas, mas também um reflexo da história de um país que acolheu povos de diversas origens. A comida é uma ponte entre essas culturas, permitindo que cada prato, seja ele sofisticado ou simples, conte uma história única sobre a formação do Brasil. A culinária do Sudeste é, portanto, um verdadeiro mosaico de influências, onde o passado colonial e a chegada de imigrantes se encontram para criar uma gastronomia que é, ao mesmo tempo, brasileira e global.

Sul: A Influência Europeia e o Frio no Cardápio

A culinária do Sul do Brasil é marcada por uma forte influência europeia, especialmente dos imigrantes alemães e italianos, que chegaram à região no século XIX e trouxeram consigo uma rica tradição gastronômica. As condições climáticas, com invernos mais rigorosos, também influenciaram o modo de preparar e consumir os alimentos, tornando a cozinha do Sul distinta das outras regiões do país. No Sul, as receitas são robustas, com ênfase em carnes, embutidos e pratos que aquecem o corpo durante os meses mais frios. A cozinha da região, além de refletir a história de seus imigrantes, também é fortemente conectada à terra, com uma utilização inteligente de ingredientes locais e nativos.

A Imigração Europeia, Especialmente Alemã e Italiana, e Seus Reflexos na Cozinha do Sul

A imigração alemã e italiana no Sul teve um impacto profundo na formação da gastronomia local. Os alemães, principalmente em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, trouxeram suas tradições de embutidos, salsichas, chucrute e pães, enquanto os italianos, em estados como Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, introduziram massas, risotos e vinhos. A convivência entre essas duas culturas europeias formam uma base sólida para a culinária sulista, que mescla técnicas de preparo e ingredientes tradicionais com os produtos locais.

Além disso, a colonização europeia contribuiu para a adoção de uma dieta rica em carnes, especialmente de porco e gado, e a introdução de técnicas de conservação como a defumação e a fermentação. A culinária do Sul, portanto, combina sabores rústicos e complexos, que falam não só da história de imigração, mas também da adaptação ao clima e ao território.

Prato em Destaque: Churrasco – A Tradição Gaúcha e Sua Relação com o Modo de Vida Local

O churrasco é talvez o prato mais emblemático da gastronomia do Sul, especialmente no Rio Grande do Sul, onde a carne é preparada de forma única. O churrasco gaúcho, tradicionalmente feito em grandes espetos de metal ou madeira, é uma celebração de carne bovina, suína e, ocasionalmente, de cordeiro. Ao contrário de outros tipos de churrasco no Brasil, o gaúcho tem uma técnica própria que envolve o uso de sal grosso para temperar a carne, que é assada lentamente, muitas vezes em fogo de chão.

Esse prato vai além da culinária; é um ritual que reflete a cultura do gaúcho, simbolizando a conexão com o campo, com a vida rural e com os laços familiares e comunitários. O churrasco é mais do que uma refeição: é um evento social, uma ocasião de celebração que reúne amigos e família ao redor da mesa. Essa tradição remonta ao modo de vida dos pampas, onde os gaúchos, herdeiros da tradição dos vaqueiros, desenvolveram técnicas de preparo que se tornaram um dos maiores ícones da culinária sulista.

Prato em Destaque: Pinhão – Ingrediente Típico do Sul e Sua Importância Cultural

O pinhão, semente da araucária, é um ingrediente típico e símbolo da gastronomia do Sul, especialmente no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Este pequeno alimento, de sabor marcante e ligeiramente amargo, é consumido de diversas maneiras: cozido, assado, ou incorporado em receitas como arroz com pinhão, sopas e farofas. Durante os meses de inverno, o pinhão se torna ainda mais relevante, sendo uma das iguarias mais apreciadas nas festas e nas confraternizações.

O pinhão carrega um grande simbolismo cultural para os sulistas, especialmente para as populações de descendência indígena e europeia, que o utilizam em pratos que celebram a conexão com a natureza. Sua colheita é um evento tradicional e envolve toda a comunidade, com o pinhão sendo visto como um alimento de subsistência e um símbolo da cultura local.

O Clima e os Ingredientes Nativos: Como o Sul se Diferença dos Outros Estados no que Diz Respeito ao Uso de Carnes e Produtos Coloniais

O clima frio do Sul do Brasil, com invernos rigorosos e verões amenos, faz com que a região tenha uma alimentação mais voltada para o consumo de carnes pesadas e pratos que forneçam energia e calor. Ao contrário das regiões mais quentes, onde a culinária é mais leve e baseada em frutos e legumes frescos, o Sul do Brasil valoriza carnes como boi, porco e ovelha, que são preparadas com um toque de defumação e curadas para aguentar o clima gelado.

Além das carnes, a utilização de produtos coloniais, como queijos, embutidos e vinhos, é uma característica marcante da culinária sulista. Esses alimentos, que se originaram das tradições alemã e italiana, estão presentes em praticamente todas as mesas da região, seja como acompanhamento do churrasco, seja em receitas que envolvem massa ou pães artesanais.

Em termos de ingredientes nativos, o pinhão, a grama-de-pasto e o mate, entre outros, também são elementos que tornam a culinária do Sul única. Esses produtos locais são aproveitados de maneira criativa, transformando a comida em uma verdadeira celebração da identidade regional.

A culinária do Sul, portanto, é uma expressão rica de influências europeias e da adaptação ao clima, que se reflete em pratos que são símbolos de resistência e tradição. Ao explorar seus sabores, é possível entender como a comida e o modo de vida local estão intimamente conectados, criando uma gastronomia que é tanto culturalmente rica quanto calorosamente acolhedora.

Conclusão

A culinária brasileira é um verdadeiro reflexo da diversidade e da complexidade do país. De Norte a Sul, cada região possui pratos que contam a história de seus povos, suas influências e as particularidades de seus territórios. A riqueza gastronômica do Brasil vai muito além do simples ato de alimentar; ela nos conecta às nossas raízes culturais, às nossas lutas, às nossas tradições e ao nosso modo de vida. Ao explorar os sabores de cada região, somos convidados a fazer uma verdadeira viagem no tempo, descobrindo como os ingredientes, as receitas e os costumes evoluíram ao longo dos séculos.

A diversidade regional, com suas combinações de influências indígenas, africanas, europeias e até orientais, ajuda a contar a história do Brasil de uma maneira única e saborosa. A culinária do Norte, com seus pratos baseados na natureza exuberante da Amazônia; a do Nordeste, que mistura as tradições africanas e indígenas com a colonização portuguesa; a do Centro-Oeste, que reflete o modo de vida rural e o uso dos recursos do Cerrado; a do Sudeste, que é um ponto de encontro de diversas culturas; e a do Sul, com suas tradições europeias e pratos que aquecem no frio, todas elas revelam a riqueza e a complexidade do país.

Além disso, a culinária brasileira desempenha um papel crucial na preservação e valorização das culturas regionais. Cada prato típico carrega consigo séculos de história e é um elo entre o passado e o presente. Ao valorizar essas tradições gastronômicas, ajudamos a manter vivas as histórias e os saberes das comunidades que as criaram, além de promover o reconhecimento da importância de nossas raízes culturais.

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